domingo, 6 de março de 2016







CAPÍTULO II 
(Conto espírita)

E SE EU PUDESSE TE AMAR?



Letícia por volta das oito horas da noite, se encontrava pronta. Escovando os cabelos e escolhendo o par de brincos em frente ao espelho, observou pelo reflexo que sua mãe se encontrava distante e ansiosa. Então resolveu trazê-la para o agora. – Não parece feliz por eu estar namorando sério.

- E isso lá é namoro sério? Os pais dele sequer sabem de você.

- Saberão hoje, o Tony irá me apresentar a família dele, mas para você nunca nada é o bastante, não é?

- Eu só acho que pobre e rico não se misturam, e quando o fazem algo sempre dá errado.

- Você tem noção do quanto é destrutiva? 

- Tenho noção do quanto sou realista, e do quanto é inconsequente. Mas... Como nada do que eu disser resolverá, boa festa. – disse sorrindo em tom de deboche.

Letícia voltou para o quarto mal-humorada e logo ouviu a buzina do carro de Tony. 

- Estou indo, não sei à que horas vou voltar.

- Eu imagino... – resmungou em tom inaudível a enfermeira enquanto tomava um gole de café. 

Letícia correu até o carro e foi recebida com um longo beijo. Algo dizia a Daniele que aquilo não seria um bom início, algo queimava dentro deles como o fechar de um ciclo. Tony parecia reluzir seu amor a cada dia mais intenso pela menina pobre de Guaianazes, e ela via nele todos os sonhos de uma doce princesa realizados. O que poderia dar errado afinal? O que poderia estragar tamanho sonho juvenil? Aparentemente nada... 

Mas a alegria e a sensação inexplicável de normalidade de Letícia foram estancadas repentinamente, logo que o carro estacionou em frente à mansão dos Ginich. Um temor pela barreira a ser ultrapassada tomou conta dela a ponto de num instante recuar. 

- Eu acho que não será uma boa ideia Tony. 

- Nada de voltar atrás justamente agora. Eu vou entrar com você, de mãos dadas, e tenha a certeza de que todos a respeitarão. Meus familiares são todos, gente muito boa. Acredite em mim.

- Mas Tony.



- Venha. – ordenou incisivamente oferecendo-lhe sua mão. Letícia aceitou o desafio, e entraram finalmente pela porta do salão anexo à casa, onde ocorria o tumulto da festa. O som extremamente alto, as luzes e o vai e vem dos garçons não permitiam que eles chamassem muito atenção. Porém, mesmo que a maioria ali presente fossem jovens, mais distante havia um segundo ambiente sob um gazebo, onde os mais velhos se reuniam. Ao longe Caleb notou a chegada de Tony, e com uma taça de champanhe nas mãos seguiu até onde ele estava em meio aos jovens. Não demorou muito, dentre o desvario da maioria ali, encontrou o sobrinho que o recebeu alegremente.

- Tio! Onde está minha irmã? Consegue localizá-la nessa loucura?

- Sua mãe estava procurando por você também. – disse ele sem perceber a presença da jovem ao lado de Tony. 

- Vou sair do salão, não consigo encontrar ninguém apesar de todos estarem aqui! - respondeu ele em voz alta pouco sendo ouvido. Puxou Letícia pelo braço delicadamente e então, por um segundo os olhares de Caleb e da moça se cruzaram... Os dele incisivos e curiosos, o dela tímidos e desejando dali desaparecer. Alguns passos e o som mais tranquilo de uma música clássica era notada no ambiente onde seus pais e tios se encontravam. Tony com um sorriso no rosto trazia a moça ao seu lado um tanto tímida. 

- Oi pai! Oi mãe! - disse em tom animado. 

Ao primeiro momento todos se alegraram ao vê-lo, porém aos poucos os sorrisos eram transformados em olhares estranhos, duvidosos e reprovativos. 

- Quero que conheçam minha namorada. – O semblante nauseante da mãe era nítido, e nada mais houve dela senão silêncio. Então a voz de Mazal, prima de Abner e mãe das únicas primas de Tony que se encontravam com os mais idosos, disse quebrando o pesado clima criado. 

- Fique à vontade, qual seu nome? 

Neste instante, os irmãos Felipe e Matheus, primos de Tony e filhos de Caleb, o chamaram repentinamente puxando-o pelo braço. Não houve tempo de sequer perceber ou chamar pela companhia de Letícia, deixando-a ali em meio aos lobos. Mais uma vez o questionamento de seu nome, porém vindo do astuto Caleb foi ouvido:



- E então? Qual é o seu nome menina? - ao ver Caleb sorrir ironicamente enquanto todos aguardavam a resposta, Abner com o rosto taciturno interrompeu, bem compreendendo a intenção do meio irmão. 

- Vamos nos recolher para um charuto, quem dos homens me acompanham? Você vem não é Caleb? - voltou o olhar sério ao irmão que silencioso meneou positivamente a cabeça, seguindo-o. 

Finalmente Mazal retornou docemente questionar-lhe:

- Então? Qual seu nome?

- Letícia.

- Meu esposo contou-me sobre uma Letícia, mas não iria gostar de conhecê-la. Creio que não aprovaria sua índole. – disse Mara ainda irritada com a ousadia do filho em trazer a suposta ladra para dento de sua residência. 

A moça calou-se num olhar fulminante contra a mulher, novamente um clima pesado se instalou. Letícia pediu licença e seguiu os passos até o salão de festas. A caminho da sala onde os homens da família se reuniram para um charuto e bom whisky, Caleb disse ao irmão incitando-o contra a jovem Letícia.

- Essa mulher será a nossa ruína.

- Ela sequer é uma mulher, é uma ninfeta sem classe nenhuma.

- E ladra! Isso não podemos esquecer, deixa-la aqui solta, amanhã faça uma averiguação geral pela mansão. 

- Já avisei alguns seguranças para ficar de olho nela. 

- Nosso Tony está correndo perigo com essa vagabunda.

O tom agressivo de Caleb desta vez intrigou Abner que, deixando o copo de whisky de lado questionou-o:

- Mas por que tanto ódio? Eu não gosto dela, não vou admitir esse estilo de pessoa rodeando meu filho por muito tempo, mas não tenho essa aversão contra ela que você tem!


- Eu vejo as coisas irmão, sabe disso, desde muito moleque que eu pressinto, ouço e vejo coisas. E eu lhe digo, essa moça é a ruína do seu filho, da nossa família.

- Não seja dramático. – respondeu Abner levando o charuto à boca, porém, reflexivo, afinal, Caleb de fato quase nunca errava seus julgamentos...





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